Muito mais que primeiro tiro à meia-noite de hoje (6/7/2018) do que pode converter-se em terrível guerra comercial, a queda de braços de tarifas entre EUA e China deve ser vista no contexto de grande virada no Grande Quadro geopolítico e econômico.
O jogo de passar adiante as culpas, e todos os tipos de cenários de especulação de como pode evoluir a disputa de tarifas, são questões periféricas. O alvo crucialmente decisivo do que hoje se inicia não é algum "livre comércio" que seria disfuncional; o alvo é o projeto "Made in China 2025" – a China autoconfigurada como usina geradora de alta tecnologia equivalente, ou mesmo superando EUA e UE.
É sempre importante destacar que foi a Alemanha que, na verdade, forneceu o molde para "Made in China 2025", mediante sua estratégia Indústria 4.0.
"Made in China 2025" tem por alvo 10 campos tecno-estratégicos: tecnologia de informação, incluindo redes 5G e cibersegurança; robótica, aeroespaço; engenharia oceânica; ferrovias para vagões de alta velocidade; veículos movidos a novas energias; equipamento elétrico; maquinaria para agricultura; novos materiais; e biomedicina.
Para que o projeto "Made in China 2025" dê frutos, Pequim já investiu em cinco centros nacionais de produção de inovações e em 48 centros provinciais, parte de um projeto para chegar a 40 centros nacionais até 2025. E em 2030, via uma estratégia paralela, a China já deverá estar estabelecida também como líder no campo da inteligência artificial (IA).
"O Sonho Chinês", mantra do presidente Xi Jinping, também conhecido como "o grande rejuvenescimento da nação chinesa", é estritamente ligado não só a "Made in China 2025", internamente, mas também, externamente, à Iniciativa Cinturão e Estrada (ICE), conceito que dá organicidade à política exterior da China para todo o futuro planeável. E os dois tópicos – "Made in China 2025" e ICE – são absolutamente inegociáveis.
Em agudo contraste, não se vê nem sinal no horizonte de qualquer projeto "Made in USA 2025". A Casa Branca parece modular todo o processo como uma batalha contra a "agressão econômica dos chineses". A Estratégia de Segurança Nacional define a China como principal força que desafia o poder dos EUA. A Estratégia de Defesa Nacional do Pentágono vê a China como "concorrente estratégico que usa economia predatória". E como chegamos a isso?